A estrada, estreita e poeirenta, começava a parecer-lhe interminável. Sentia-se impaciente. Fez a curva apertada à direita e assustou-se, quase não conseguia dominar o carro. Percebeu que ia depressa demais naquela estrada secundária, abrandou, antes que a pressa lhe matasse os planos. Na sua cabeça, a dúvida não lhe dava tréguas - será que vou conseguir encontrá-lo? Avistou um caminho à direita. Desviou lentamente da estrada e, ao longe, pareceu-lhe ver um pequeno edifício antigo. Era a escola! O seu ponto de referência ali estava, a mesma escola de que se lembrava, mas agora sem desenhos nas janelas, sem crianças, sem vida, a mesma escola, mas abandonada e quase em ruínas. Parou o carro, saiu e olhou em volta. Decidiu-se a ir pela esquerda, confiando perigosamente no seu sentido de orientação. Foi andando, olhando para um lado e para o outro, procurando ansiosamente aqueles sinais que guardava na memória. Caminhou uns minutos, amedrontada, mas decidida. De repente, ergueu-se à sua frente o barracão de madeira, tal e qual como se lembrava dele. Devia estar prestes a chegar. Passou o barracão e um pouco mais à frente, lá estava ele: o bosque! Sentiu no ar o aroma a madeira e a terra que em vão procurara, ao longo dos anos. Voltaram-lhe à cabeça as memórias de uma infância longínqua, do seu esconderijo secreto, da primeira carta de amor que ali escreveu, das construções com pedras e folhas, das guloseimas escondidas que ali comia deliciada. Avançou mais um pouco e olhou demoradamente para cada uma delas: quatro árvores grandes e imponentes que, entre si, formavam um círculo perfeito. Lembrou-se de como no verão os ramos e as folhas de umas se misturavam com os das outras, criando uma cabana de sombra. Aproximou-se de uma e procurou com os olhos e com as mãos. Encontrou, finalmente: gravado no tronco, lá estava o número 9; procurou em cada uma das outras árvores e encontrou os restantes : dois círculos e um 2. Sentiu-se feliz, sorriu e gritou: 2009! No Outono de 1989, tinham-lhe roubado o seu bosque. Na última vez que lá foi, consumida pela revolta de, aos 10 anos de idade, não lhe reconhecerem o direito de escolha, tinha gravado furiosamente estes algarismos, um em cada árvore, simbolizando este conjunto a promessa de um dia voltar ao seu bosque. Olhou para o relógio: eram 11 horas da manhã do dia 18 de Outubro de 2009. A promessa estava cumprida! Sentou-se bem no centro do círculo formado pelas quatro árvores, no centro do seu bosque e soltou uma enorme gargalhada.
18.11.09
11.11.09
Hoje o dia vai ser só meu...
Naquele dia, acordou antes do despertador tocar e, estranhamente, apeteceu-lhe logo levantar. Foi à janela e gostou do que viu. A manhã estava fria, mas clara e ensolarada, finalmente o sol vencera a chuva interminável dos dias anteriores! Tomou um longo banho, maquilhou-se, penteou-se, vestiu-se e perfumou-se. No final, demorou-se a olhar para a sua imagem reflectida no grande espelho que tinha no quarto. Já nem se lembrava há quanto tempo não se sentia assim, interessante, bonita, cuidada. Olhou-se com mais atenção e sentiu que faltava qualquer coisa. De repente, lembrou-se. Abriu a gaveta da cómoda e lá estava ela, a velha caixa de madeira, que a acompanhava há tantos anos! Abriu-a e deteve-se a olhar cada uma delas, tocando-as, sentindo-lhes a textura, absorvendo as suas cores. Decidiu-se pela lilás, ficava bem com a camisola preta que vestira e a sua forma sugeria a paixão que a inundava, desde que acordara. Colocou-a no peito, um pouco acima de decote, voltou a olhar para o espelho, sorriu para si própria e pensou: hoje o dia vai ser grande e diferente. Hoje o dia vai ser só meu! Pegou na carteira, fez uma festa no gato e saiu, batendo com a porta de casa.
Subscrever:
Mensagens (Atom)