Entrou e olhou à sua volta. Observou atentamente cada uma delas, mas rapidamente encontrou a que queria.
- Quero esta branca - disse para a empregada.
- Pode tirar, menina.
Retirou-a cuidadosamente do recipiente onde estava com muitas outras e dirigiu-se ao balcão.
- Vou fazer um arranjo bonito, está bem? Ponho uns raminhos verdes, um papel de celofane e ...
- Não, levo-a assim mesmo, tal como está - interrompeu.
A empregada olhou-a, com ar ofendido.
- Assim, sem mais nada?!? - perguntou.
- Sim, ponha só uma fitinha de cetim, pode ser aquela, côr-de-laranja.
- Está bem, mas olhe que esta é muito frágil, tem de a levar com cuidado, senão quebra - avisou.
- Sim, eu tenho cuidado.
Pagou e saiu.
Antes de retomar o caminho, dobrou o braço esquerdo em forma de alcofa e levou-a cuidadosamente, como um bebé recém-nascido. No caminho, foi buscar os filhos à escola. Vinham desalinhados e despenteados, mas com ar bem-disposto.
- Mãe, podemos ir ao parque? - perguntou o mais novo.
- Não, ao parque não, a mãe tinha dito que hoje íamos às compras - disse a menina.
- Compras?!? Eu quero ir ao parque!
Interrompendo a discussão, surgiu da esquina um homem, sujo e mal vestido, com um olhar jovem num rosto envelhecido.
- Minha senhora, dê-me qualquer coisa - pediu.
- Não tenho nada para lhe dar...
- Qualquer coisa, hoje ainda ninguém me deu nada... - insistiu.
Resignada, baixou os olhos e olhou para ela, tão branca, tão delicada. Pegou nela e estendeu-lha.
- Quer esta flor?
O homem ficou estático, depois sorriu.
- Sim, quero sim senhora. É muito bonita...
Antes de lha entregar, desatou a fita de cetim e guardou-a no bolso.
- Tome, cuide bem dela.
- Obrigada, vou cuidar.
Continuaram o seu caminho.
- Mãe, porque é que deste a flor ao senhor? - perguntou o filho.
- Pois, podias ter dado uma moeda - acrescentou a filha.
- Ele não queria moedas... - respondeu.
- Não?!?
- Não, ele queria outra coisa... queria atenção.
- Ahn - respondeu o pequenito, sem perceber nada.
- Claro! - respondeu convictamente a filha, na superioridade dos seus 9 anos.
- E afinal, sempre vamos ao parque?
- Não. Não vamos ao parque nem às compras. Hoje vamos fazer uma coisa especial - respondeu com voz misteriosa.
- O quê?!?
- Vamos festejar a noite de Natal!
- Hoje? Natal? Mas estamos em Julho, mamã - respondeu a filha.
- E depois? Está decidido: esta noite, em nossa casa vai ser Natal!
- Mas não temos árvore de Natal...
- Temos a laranjeira do quintal.
- Pois é!... - o pequeno começava a ficar entusiasmado.
- Sim, mas os enfeites estão em casa da avó - lembrou a menina.
- Arranjamos outros - respondeu a mãe. Meteu a mão no bolso e tirou a fita de cetim.
- E o que vamos comer?
- Eu trato disso. Faço biscoitos e bolo de iogurte - respondeu a filha.
A mãe parou subitamente e olhando para cada um dos filhos, disse sorridente:
- Então, estamos combinados. Tu tratas do jantar, Margarida. E tu, David, tratas das decorações.
- Mamã, mas não temos luzinhas para pôr na árvore de Natal... - disse o menino.
- Mas temos todas as estrelas do céu a brilhar... e temos uma, maior e mais brilhante, que é só nossa e nos vai iluminar toda a noite! - respondeu docemente a mãe.
- Está bem, vamos embora então, temos muito que fazer! - disse a menina, com ar atarefado.
A mãe no meio, um filho de cada lado, de mãos dadas, apressaram o passo e subiram rapidamente a rua, tão rapidamente que, quando chegaram ao cimo, pararam para recuperar o fôlego. Foi nessa altura que o menino, na inocência dos seus 6 anos, olhou para a mãe e disse:
- Mamã, no Natal nasce o menino Jesus, não é? Então, se hoje é Natal em nossa casa, quem é que vai nascer?!?
A mãe sorriu enternecida, olhou para um e para outro e respondeu:
- Hoje nascem muitas coisas... nasce o primeiro bolo de iogurte da Margarida... nasce uma árvore de Natal no quintal... nascem os enfeites inventados pelo David... nascem a lua e as estrelas quando anoitecer... e vamos estar toda a noite acordados!
- Toda a noite?? - perguntou, incrédula, a menina.
- Fixe!!! - disse o pequenito.
- Sim, toda a noite acordados, toda a noite juntos, a comemorar o que nos apetecer, iluminados pela luz branca daquela estrela de que vos falei, a maior e mais brilhante do céu, aquela que é só nossa.
Para a I., estrela branca e brilhante... para a M.R., que sabe que em Julho também pode haver noites de Natal... um beijo no coração.